terça-feira, 28 de agosto de 2007

Seguradora lança apólice para casos de assédio moral

Fonte: Luiza de Carvalho. VALOR ECONÔMICO. 28/08/2007

O aumento do número de ações judiciais movidas por funcionários que alegam ter sofrido assédio moral, discriminação ou assédio sexual nas empresas provocou o surgimento da primeira apólice de seguro para garantir o pagamento de indenizações por práticas indevidas no ambiente de trabalho. Recém aprovada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) a pedido da Zurich Brasil Seguros, a apólice surge para fazer frente a processos cuja indenização pode chegar a R$ 1 milhão.

O crescimento das disputas judiciais envolvendo condutas deste tipo na Justiça do Trabalho - em especial ações que pedem indenização por assédio moral, uma das mais recentes - já é visível nas poucas estatísticas disponíveis sobre o tema. No ano passado, o Ministério Público do Trabalho abriu 337 investigações no país para apurar casos de assédio denunciados e supostamente praticados por empresas de diversos setores - têxtil, cosmético, farmacêutico, químico, metalúrgico, financeiro e estatal. Somente no primeiro semestre de 2007, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo recebeu 205 processos envolvendo alguma forma de discriminação.

Segundo Eduardo Pitombeira, diretor de seguro financeiro da Zurich, a estimativa é a de que até o fim do ano o novo seguro de práticas trabalhistas indevidas seja vendido para cinco mil empresas no país. Para ele, a apólice foi motivada por fatores como o aumento da fiscalização nas questões de assédio moral e a conscientização dos trabalhadores, que passaram a ter maior acesso à Justiça. "Para que o seguro seja viável, a Zurich irá observar na empresa que solicitar o serviço aspectos como a eqüidade de remuneração e o cumprimento da carga horária", diz.

O seguro destina-se à cobertura de diversos atos ilícitos, tanto em processos contra a empresa quanto contra o empregador. Além da discriminação e do assédio moral e sexual, a apólice abarca dano moral, demissão injusta ou imotivada, condutas lesivas à honra e à integridade, privação de oportunidade de carreira, retaliação, injúria e ainda a invasão de privacidade. Segundo Pitombeira, o seguro também inclui uma consultoria para o gerenciamento dos riscos trabalhistas na empresa e um comitê de acompanhamento.

O seguro cobrirá o chamado "sinistro incubado" - reclamações ocorridas durante a vigência do seguro, mas referentes a infrações cometidas antes dela -, desde que a empresa não tenha conhecimento prévio do processo. Para garantir que a empresa não tenha prejuízo nos casos de julgamentos demorados, a apólice prevê que a seguradora arque com os custos da defesa judicial. Já o custo da franquia não é fixo e será estabelecido em cada negociação.

Para a advogada Vera Carvalho Pinto, do escritório Neumann, Salusse, Marangoni Advogados e responsável pela revisão da apólice, o seguro evita que as empresas sejam surpreendidas com indenizações de alto custo e que possam desorganizar o seu orçamento. A preocupação das empresas se agravou quando entrou em vigor a Emenda Constitucional nº 45, que implantou a reforma do Judiciário em 2004 e determinou que cabe à Justiça do Trabalho julgar processos por dano moral decorrentes de questões trabalhistas. Até então, a competência para o julgamento destes casos não estava prevista em lei. Segundo a procuradora regional do trabalho de Brasília, Adriane Reis de Araújo, após a emenda as empresas começaram a mudar sua postura, especialmente no caso de "castigos" aplicados como forma de motivar a produção e o cumprimento de metas. "Mas ainda encontramos relatos de práticas abusivas no Brasil inteiro", diz. Segundo ela, algumas delegacias regionais estão organizando grupos de combate à violência psicológica no trabalho.

O surgimento de seguros como o de práticas indevidas no ambiente de trabalho segue uma tendência mundial - nos Estados Unidos eles surgiram nos anos 80 e na Europa, na década seguinte. A apólice brasileira é o resultado da adaptação de uma versão britânica e precisou ser alterada de acordo com as exigências da Susep. "Tive de levar em consideração mais de 100 itens da Susep para definir quesitos como a base de juros e a franquia", conta Vera. Apesar de ter sido adotada somente agora no Brasil, a criação de um seguro que garanta o pagamento de condenações de empresas em processos que pedem indenizações por danos morais já vem sendo estudada por seguradoras nos últimos anos. Para Leandro Martinez, gerente das linhas financeiras da seguradora Chubb do Brasil, o fenômeno é natural. "O mercado de seguros têm de se modernizar para atender novas situações de risco", diz.

A apólice para os casos de assédio e discriminação no ambiente de trabalho é mais uma relacionada aos riscos judiciais de empresas que surge no mercado. Além do seguro de responsabilidade civil - já bastante popular entre executivos de empresas, médicos e até advogados para fazer frente a processos judiciais que pedem indenização por danos causados a terceiros -, há ainda no mercado o seguro-garantia judicial, que pode substituir a penhora de bens ou dinheiro e já está inclusive previsto em legislação - a Lei nº 11.382, de 2006.